sábado, 16 de junho de 2012

Vaguear

Os cinzeiros estão cheios, o chão à espera de ser varrido pelo empregado sonolento, de honesta má disposição que apenas quer fechar o estabelecimento. As cervejas fazem linhas que se entrecruzam nas mesas, todas iguais, simbolizando um tipo qualquer de ocupação do tempo ou de elevação artificial do espírito para as massas.

Pela rua, sigo as pedras de calçadas, conto-as e reparo num passar do tempo diferente, num tempo que me absorve a consciência, a vaguidão da vida. As passas do cigarro marcam o ritmo, o brilho laranja de cada travo a luz do caminho; o fumo, como migalhas de Hansel e Gretel - sigam a vida citadina e cheia de modas.

Rangem as solas das all-star que ninguém vê no escuro, à medida que palmilham um caminho falsamente certo, mas que não leva a lado nenhum. Tudo é passeio, tudo é fogo de artifício que ilude os meus olhos vermelhos de ser ébrio, as minhas pestanas coladas de quem chorou as certezas que julgou ter na monotonia de um ciclo.

Sente-se na noite o ar vago, a luz difusa, a rua deserta. Assim que estou sozinho, é assim que me sinto: pele e roupa, frágil, engolida pela mesma esfera de sempre, que mete medo, que mete desespero. Acende-se mais um cigarro até ao conforto de um lar que não me espera mais a mim do que a qualquer homem perdido, animalesco, moribundo.


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