quinta-feira, 31 de dezembro de 2009

Viagem

O teu único objectivo é atravessar essa barreira que divide o presente do futuro, as mágoas da esperança. Pensas que te será concedida uma nova luz, um tapete vermelho para tudo o que desejas - como que por milagre.

Não preciso de uma deixa tão forçada para pensar no ió-ió no qual se tornaram os meus passos, ao longo de todo este tempo. Sei que devia ter ido, devia ter feito...devia ter sido alguém mais perfeito.

Dizem-me para ficar, mas não consigo. É tarde. E vou, vou, vou, vou...até onde ninguém me consiga desiludir, até que ninguém me possa soprar mais dúvidas ao ouvido.

Aqui posso sentir as gotas dos céus a lavarem-me o rosto e o corpo - o espírito e a alma. Porém, ninguém quer encontrar esta ilha do tesouro. Fica demasiado longe e é confusa como um labirinto escuro e ambíguo - dizem eles, amarrados à sua cegueira.

Sorrio, divertido, quando julgam compreender a insatisfação eterna que em mim mora -mas como eu gostava que alguém ousasse acompanhar-me nesta cruzada.

De que vale tê-lo se não o consigo encontrar? De que vale senti-lo uma vez se não o consigo guardar?

Porquê existir se tudo o que faço é vazio? Porquê procurar de fio a pavio?

Não conheço as respostas. Ninguém conhece a cura para esta doença que não me deixa encontrar a dor.

É por isso que não quero voltar, é por isso que nunca me vou encontrar.

segunda-feira, 28 de dezembro de 2009

Inside the skeleton

Ele podia ter escolhido outro dia para enterrar o mundo. Ainda podia girar tantas vezes, apesar das suas faces queimadas que se sabiam um novelo de hipocrisia...

E agora, para onde olhar? E agora, para onde voar?

Raios! Passou demasiado tempo embebido numa atmosfera de raiva supersónica, raiva essa que rapidamente atingiu multidões.

Algo o impediu de ouvir as vozes que gritavam por um pouco mais de calma - pelo espaço etéreo no qual nunca repousara aquilo que aflorava a sua pele pálida.

O seu cérebro parou e a sua boca apenas pôde proferir um misto de pânico e de choque, envoltos pelo ambíguo das palavras.

Agora é dono do vazio, do preto do ar, da histeria do silêncio.

É só uma sombra da alma, um pedaço de confusão latejante no meu caminho.

domingo, 27 de dezembro de 2009

Nunca

Nunca perdeste a cabeça.

Nunca te esqueceste de amanhã e arriscaste no agora.

Nunca gritaste aquilo que o teu corpo já não consegue suportar.

Nunca destruíste os muros que te barram a luz.

Nunca ouviste os sussurros vindos do mundo dos sentidos.

Nunca foste magoado pelas garras da ilusão, que rasgam a razão e fazem bater violentamente o teu peito.

Nunca soltaste o teu verdadeiro eu, ansioso por conhecer o calor e o frio - a sombra e o brilho.

Nunca me viste, do outro lado do vidro. Nunca me viste enquanto estavas inconsciente, perdido nesse mundo sem sentido.

Nunca vais seguir a estrada. Nunca vais deixar de optar por becos sem saída. Nunca vais escolher viver.

sábado, 26 de dezembro de 2009

Vago?

Só tu foste convidado para essa festa.

Nela ninguém te vai roubar o papel principal. As únicas lágrimas que se ouvem são as tuas, perdidas no fundo de um buraco que se avizinha cada vez mais escuro.

Não há luzes alegres e irreverentes. Basta o ar - para que o sopro da alma arrepie, gélido, o vazio incerto de almas à procura da sua casa.

Não sabes para onde ir porque não sabes onde estás. Não sabes o que procuras porque não sabes o que tens.

Mas não deixes que te encontrem! Querem levar aquilo de que és feito - as perguntas sem resposta, as tuas viagens sem destino nem percurso.

Não permitas que te escondam daquilo que és ou que te tornem no cinzento das cinzas - cinzas dos sonhos que se perderam contigo.

What's so wrong?

Hmm, sim. Havia algum tempo que nada me parecia tão apetecível - tão certo.

Talvez seja o esguio traço do rosto. Talvez seja o sorriso genuíno. O olhar imenso, transparente como um vidro.

Hmm, como eu gostava de me sentar encostado a ti, apenas. Ou até de fazer ondas com os teus fios de cabelo. Como eu gostava que esse teu mundo ainda não estivesse completamente saciado...

As minhas defesas são inúteis. Puxas-me como o vento num dia de tempestade, sem sequer entenderes aquilo que guardo envolto nesta capa arrebatadora.

Porque é tão difícil? Bastava apenas desapareceres num sopro, na esperança de encontrares um abrigo seguro.

És demasiado frágil mas, ao mesmo tempo, conseguiste fechar-me dentro dos meus sentidos. Algo me prende, algo mais forte do que o medo que sinto.

E se a tua pele me aprisionar? E se os teus olhos me cegarem, quando finalmente chegar o dia? E se os teus lábios me queimarem?

Não consigo resistir por muito mais tempo. As horas perderam o sentido, desde que as teias se começaram a apoderar deste livro fechado...

quarta-feira, 23 de dezembro de 2009

Agulhas doentias

Suspiro, lenta e aborrecidamente. Contemplo os socalcos de um monte anafado, com algumas miniaturas e árvores espalhadas ao longo da sua encosta.

Os meus pés gelam e os meus olhos aproximam-se perigosamente de um estado de precipitação lacrimosa.

Desejava tanto estar ali como no inferno, com todos os ossos a quebrarem lentamente no leito odiável das chamas – quem raio achou que podia julgar os erros dos outros e enviá-los para tal lugar?

Aquele lugar cheirava a velhice, levada ao extremo pelo mofo intenso espalhado pelas divisões.

O arranjo floral que a mesa ostentava era humilde, decerto o oposto do mestre que o criara. Mestre esse pouco ortodoxo e implacável, capaz de fazer sangrar qualquer um com as suas agulhas proferidas uma vez e outra, sempre implacáveis.

Nunca há-de partir, diz ele do alto da sua sapiência e presunção. Como é possível ser tão inculto, tão intocável pelo mundo brilhante que viva à sua volta?

Talvez a culpa seja do mofo e bolor. Acho que ele já morreu há muito, apenas aguarda pacientemente que o corpo ceda aos intentos da sua alma pisada.

Suspiro de novo. Prefiro o inferno - ainda assim, é quente.

terça-feira, 22 de dezembro de 2009

Sufocado pelas regras

Pedi-te algo tão simples como respirar, algo que sabia de antemão que irias recusar.

Olhas-me com um ar incrédulo, irónico, como se desejasses desatar a rir de algum profundo disparate escondido nas minhas palavras.

Não vai voltar a acontecer, não deixarei que a tua decadência limitada se volte a pousar em mim, travando as minhas fugas do mundano.

Sabes que preciso de correr, de acalmar a minha alma volátil, cujos impulsos me guiam como ninguém conseguirá algum dia fazer, latejantes.

Sabes que preciso de chegar ao fim do mundo, preciso de me ferir pelo caminho, voar nas asas da adrenalina que atravessa o próximo perigo do caminho.

Um dia irei regressar dessa travessia alucinante com cicatrizes, cicatrizes que tu não queres que eu sofra.

Mas não tenhas medo, fá-lo por mim. Não tenhas medo, não irás perder o teu trono.

segunda-feira, 21 de dezembro de 2009

Well I wonder...

Não sei porque voltei a olhar para a tua fotografia de cores vivas e alegres, quando já a julgava moribunda e cinzenta.

Abri a janela, presa e enferrujada. Aproveitaste e entraste de novo no meu espaço, sem pedires sequer para entrar.

Baralhaste-o, fizeste com que se tornasse numa amálgama de memórias, de desejos, de dilemas, de arrependimentos.

Porque voltei a centrar-me em ti, quando és aquilo de que menos preciso?

Raios! Também não quero esse antídoto que a razão me deu; prefiro viver contaminado pelo teu veneno doce - esse que faz com que os segundos corram, fatais; esse que faz com que fique vulnerável, fraco, genuíno.

Espero que o torpor se apodere do teu corpo quando voltares a olhar para os meus lábios, delicados, que mal conseguem esconder as suas intenções.

Espero que não te tenhas esquecido de mim.

sábado, 12 de dezembro de 2009

A cápsula perfeita

Deixas-me doente.

Porque tens de me fazer crer que não sou capaz? Porquê? Porque fazes com que o calor se dissipe, para nunca mais voltar?

Era tão fácil deixares-me viver. Era tão fácil deixares-me morrer.

Agora tens-me aqui, imóvel, petrificado pelo teu olhar gélido. Fixa-lo em mim, como se não te apercebesses do seu efeito.

Afinal não me deixaste doente. Mas eu queria ficar doente. Queria pisar a linha, rasgar o risco.

Desaparece. Para nunca mais esconderes tudo o que me faz sentir vivo.

terça-feira, 8 de dezembro de 2009

Sonhos

Quando o olhar se cerra
Quando a pele se liberta
Bem alto, a alma berra
De sonhos vazia e deserta

Cercado por várias cruzes
Num vazio distante
Deixo para trás as luzes
E o meu corpo errante

Viajo no infinito do tempo
Longe das lágrimas salgadas
Não há dor, não neste momento
Apenas um conto de fadas

Não importa onde estou
Nem sei para onde vou
Fui feito para voar,
Para o vento me levar

Dois passos para o acordar
Tudo desaparece como o fumo
Branco e baço, que paira no ar
Também ele à procura de rumo

Ainda bem que tudo acabou
Tal como as saudades que senti
Mas sou tudo aquilo que restou
Depois de ser quebrado por ti

sexta-feira, 4 de dezembro de 2009

Quando irás voltar?

Agora sei como te sentes.

O nevoeiro esconde-te as portas da alma, como se de um turbante se tratasse.

Começas a andar cada vez mais devagar, para não tropeçares nos ramos que escolheste para infernizar o teu trilho.

Desapareces da sala e surges num pântano maquiavélico, escuro, sem respostas. Nele o sol recusa-se a brilhar; dele ninguém te vai conseguir tirar.

A tua cabeça gira, confusa, martirizada pelas vozes estridentes que não se deixam reconhecer. Cada uma com uma cantiga diferente, que não consegues interpretar.

Oh, nem sempre foste assim.

Porque deixaste que rasgassem o teu mapa?

Porque te fechaste às vozes doces que murmuravam a tua salvação?

Porque deixaste que os teus sonhos fossem amarrados por teias velhas e pegajosas, que nunca hão-de libertar-se?

sábado, 28 de novembro de 2009

Disperso

Deixaste-me no deserto de Namibe
Tórrido, onde ninguém sobrevive
Onde perco as horas que um dia tive

Não me vais guiar até ti
Deixas-me caír como folha cansada
Foste o único livro que não li
Aquele que abri na página errada

Não vou esperar
Não me vou questionar...

Vou saltar sozinho, caír no escuro
Do caminho, seguir essa linha torta
Esconder-me atrás do teu muro
Deixar esfumar-se a esperança morta

Fecho os olhos

Afinal chegas, fatal como o vento
Talvez num sopro, ou num momento
Devolves-me o que levou o tempo
Detens-te no meu olhar, atento

Quebras a barreira da distância
Subitamente, acabas com a minha ânsia
De não te ter, de não te poder agarrar
Transformas o deserto no azul do mar

Lá nunca me irei afogar
Os sonhos boiam, no meio do sal
Lá ninguém nos irá procurar
O mundo fica lá fora, não nos pode fazer mal

sexta-feira, 13 de novembro de 2009

Sangue humano



Chovia. Aguaceiros escuros, azuis, ruidosamente zangados.

O vidro estava embaciado. Algumas gotas escorriam, satisfeitas, naquele escorrega. Faziam novos ornamentos no desenho que ali tinha sido rabiscado com o dedo, com a precisão de um bisturi.

Ela contemplava, suspirando, aquele espectáculo poderoso, através do ecrã difuso e húmido. Que temporal intenso se abatera sobre a cidade. Esperava que as condições melhorassem no dia seguinte, pois teria de percorrer uma longa distância para visitar a sua mãe, em Bonneville.

Bocejou, com algum sono. Chegara a casa cansada daquele dia de trabalho. Ainda tivera de transportar a botija do gás ao longo de 3 andares daquele prédio, visto que a sua humilde casa não tinha gás canalizado.

Tinha o jantar na panela, ao lume. Virou costas à janela, com o intuito de verificar se já estava pronto.

Não teve tempo de dar um passo. Subitamente, percebeu que algo estava terrivelmente errado.

Petrificada, sentiu o seu corpo a ser violentamente empurrado contra a janela da cozinha. Vários pedaços de vidro cravaram-se no seu corpo, magoando como alfinetadas sangrentas.

Ao mesmo tempo, evitara vários objectos supersónicos, fumegantes, que invadiam agora o local onde o seu corpo estava.

Aquele cubículo rústico acabara de explodir, pintando de fuligem o resto do que segundos antes eram paredes brancas, com algumas rachadelas apenas.

Os seus cabelos negros perderam-se no ar, 6 pisos acima do julgamento final.

A chuva tornara-se negra, também; não, tal não acontecera porque a sua pele nela se dissolvesse.

Eram apenas lágrimas. Lágrimas de quem tem um prazo de validade rígido, incontornável; de quem sabe que tudo irá acabar em breve, de quem tinha tantos planos pela frente.

O vento soprava vertiginosamente, agitando o corpo, enquanto deixava a sua alma completamente destroçada.

Não conseguia recordar-se de mais do que pequenos fragmentos de memórias, aleatórios.

Uma sala escura, com uma senhora desmaiada no chão, e cacos de uma jarra chinesa à sua volta. Depois, uma menina com a mochila às costas, com medo do seu 1º dia, a ser empurrada por alguém e a caír no pátio da escola. E tudo se esfumou...aparecendo no seu lugar um grupo de raparigas a apontar para ela, que estava sozinha, pensativa, sentada no chão.

Tentou respirar uma vez mais. O ar estava gelado. Fechou os olhos, e aquela foi a última vez que olhou para aqueles blocos de betão, desses que fazem prisioneiros e algemam sonhos. Que ódio lhes tinha.

Subitamente, recordou-se de algo essencial, e sentiu-se quente, confortável até. A tepidez dos lençois da casa da sua mãe, onde estava protegida dos lobos maus e obscenos, albinos. Lembrou-se também de uma margem de um rio, onde estava com a sua [outrora] alma gémea, a olhar para o horizonte, de mãos dadas. A seguir, um ser minúsculo, frágil, abandonado nos seus braços.

Valeu a pena, pensou. Valeu a pena respirar aquela fragância bela, sentir os arrepios no corpo, olhar os gestos que lhe entorpeceram as entranhas e a impediam de fraquejar, hesitar. Valeu a pena lutar.

Não, ela não fora derrotada, naquele passeio de betão escuro nos subúrbios daquela localidade. Aquelas manchas no chão iriam ser vistas por todos, iriam mostrar o quão igual era aquele sangue salgado.

segunda-feira, 9 de novembro de 2009

Refúgio




Outro dia passa. Mecanicamente, tranca a porta da sede da empresa e dirige-se, ausente, para o carro. Enxota os miúdos que lhe vedam a saída, e quando estes se afastam, arranca ainda a barafustar, deixando no ar um rasto de tempo que esvoaça, perdido.

Enquanto espera, impedido pela estrada, amarrado ao tráfego algo congestionado que se faz sentir, pensa.

Pensa nas dívidas a pagar, nas pessoas que tem de entreter, persuadir, engraxar. Pensa na imagem que tem de passar, naquilo que tem de ostentar, na vida da qual não se consegue libertar.

Não lhe apetece ir para casa. Ninguém o espera. Não tem nada para além da monotonia do jantar, da televisão, do seu sono insípido.

Subitamente, aquele carro cinzento ruge rumo às montanhas, num caminho tomado inconscientemente. Tenta recuperar cada segundo perdido à medida que passa no mais singular pedaço de alcatrão, de cascalho, de areia.

E quem o conduz é agredido por uma mão fria na noite [que noutras ocasiões se limitaria a fazer carícias na face], graças aos vidros abertos até ao fundo. Cada uivo atiça a adrenalina, queima a face.

Oh, está a ficar escuro. Não lhe importa, pois a esta hora ninguém o irá incomodar com perguntas irritantes, perseguições policiais aborrecidas e assuntos da empresa.

Cada curva traça o seu destino, à medida que a distância de casa aumenta.

Até que, lentamente, começa a abrandar...e esboça um sorriso, ao fim daquele longo dia [e ao mesmo tempo, tão vazio...].

Pára o carro ao acaso na berma, deixando a porta aberta. Atravessa a estrada sem prestar qualquer atenção. Começa a descer uma colina, cheia de pedras, terra solta, galhos partidos.

É difícil ver no escuro, e ele acaba por tropeçar e caír, sujando o fato.

Não lhe importa -não agora. Tira o blazer, atira-o para trás das costas e continua a correr por entre os pinheiros magistrais.

O barulho dos passos apressados, dos ramos mastigados, dos animais perturbados com aquela presença mistura-se com o grito melodioso [sobre-humano] do vento, ferindo-lhe os ouvidos.

Começa a chover. As pequenas folhas das árvores vingam-se no corpo dele, atirando contra si as gotas daquele começo de tempestade. As suas vestes ficam molhadas, deixando o seu corpo gelado.

É preciso mais do que isso para o parar; fugir do sargaço a que chama vida foi mais forte; conseguir novamente ser humano, ter o dom de sentir dor, ultrapassou as armadilhas que o caminho lhe armou.

Naquele momento, as suas 5 mãos arrepiam-se, fazem-no saber quem ele é. Nada mais lhe atravessa a mente - nada. Apenas marcar aquele momento com a intensidade da loucura.

Pisa as folhas com a determinação e vontade com que devia pisar as suas hesitações, agoniantes. Os céus tornam-lhe difícil abrir os olhos - ou será que apenas o protegem, impedindo-o de ver o seu mundo cruel?

A certa altura, chega o limite. As árvores ficaram para trás, e tudo o que resta é uma ravina cujo fundo é longínquo [da vida].

O céu parece triste - mais escuro e tenso do que o habitual. Não gosta de se ver carregado de amargura, e lança-a de novo para quem a criou.

Em breve, as nuvens irão aparecer novamente mais claras, ou até desvanecer-se; tudo ficará bem.

Os ramos espalhados pelo chão, torturados por quem ali caminhou, apenas deram lugar a outros mais fortes e mais novos.

O cheiro a terra molhada e o chilrear dos pássaros que se confunde no meio de tantos ruídos hipnotizam-no.

Terá de voltar mais tarde. Sobe com dificuldade a colina e, ao fim daquela eternidade, vislumbra novamente a estrada. Felizmente, ninguém roubou o carro. Entra, liga o motor e a chauffage com ar quente virado para si.

Por uma fracção de segundos, lembrou-se do que acabara de acontecer. Resignou-se.

Arrancou lentamente. Ao fim de alguns minutos, deixou-se confundir no meio do tumulto de carros.

sexta-feira, 6 de novembro de 2009

Love don't live here anymore

Estás sempre certa, como um Deus perfeito que nunca falha, que não precisa que o protejam.

Estás errada. Deste um passo - mas não percorreste o caminho. Disseste uma palavra - mas não acabaste a frase.

Deixas-me vão de paciência, surdo face às palavras hipócritas que murmuras, mudo de palavras de compreensão. Não consegues ouvir o canto do rio que corre em mim, a indecisão das minhas armas, o prato que se partiu, trémulo.

Sais para um beco escuro, sem saberes quando voltarás a encontrar o teu lar. Por fora todas as casas são iguais - cheias de janelas e portas, com vida para dar e vender. Mas mais nenhuma se irá abrir e deixar-te abusar da sua vontade.

Corre, ou irás encontrar a porta fechada, trancada a sete chaves.

Cega? Com medo de voltares para trás. Tens medo do arrependimento, e guias-te pelo teu mapa - o orgulho que te lança num caminho cada vez mais estreito, pejado de pedras e tempestades.

Continuas como soldado perdido, mas acabas por tropeçar na tua própria mina - aquilo que sentes.

Ninguém te irá procurar. Perdeste-te com quem nada sente por ti, com quem prefere ver-te morta a morrer.

Não penses que estiveste só contra todo o mundo. A culpa foi tua.

Demoraste demasiado tempo. Já não moras aqui.


terça-feira, 3 de novembro de 2009

Turn the page

Não me compreendas.

Não me abraces e digas que percebes aquilo que sinto. Quero ser um livro ilegível, um código indecifrável. Não me quero encontrar.

Ser racional? Nem pensar. Onde pára a paixão humana? Antes o preconceito e o ódio do que a indiferença e a frieza.

E, ao mesmo tempo...esse turbilhão de sensações deixa-me perdido, difuso no meio do ar, sem uma mão segura que me dê conforto. Conforto do qual preciso, quando falho perante os mais fúteis detalhes do jogo.

Deixa-me à deriva no rio, sem ninguém que me salve das águas revoltas. Sei que vou ficar preso no remoinho, mas não me importo. Indefeso, inútil, idiota. Todos dizem o contrário, mas o que percebem eles? Porque ousam pensar que podem ajudar?

Subitamente, borbulha em mim a raiva capaz de cegar a alma, de queimar a mente, de atiçar o meu lado negro. Sinto-me capaz de ofender, de bater, de matar. Não vou deixar que algo mais se atravesse no meu caminho. Mas tudo se começa a dissipar...

Acabo por voltar a mim. Sinto-me imundo. Suspiro. Não me deixarei toldar por esse mau génio, sempre pronto a apoderar-se das minhas fraquezas. Não me irei tornar numa criatura tão desumana.

Irei começar do zero. Começar uma nova sinfonia. Deixar que a luz me faça sentir vivo, trancar o que me fez tropeçar no passado. Parar perante o alaranjado pôr do sol, delineado pelas nuvens, a chamar-me para o horizonte, para o futuro.

Vou virar a página.

domingo, 1 de novembro de 2009

Pumpkins and fun

Saio do armário. Deixo lá trancadas sombras escuras do passado. Trago vestes que me escondem o corpo e a alma.

Parece noite de Halloween. Não sei porquê, não sei como, mas estou na rua. O alcatrão sujo está deserto, e as árvores deixaram já caír as suas folhas no chão, como frutos maduros. Sou o único que divaga pela luz difusa dos candeeiros amarelados e sujos.

Ando sem parar, com a mente em branco, rumo a lado nenhum - rumo ao destino. A luz começa a ficar para trás. As árvores e a vegetação multiplicam-se. As casas tornam-se menos numerosas, e o silêncio é tão sugestivo...

De subito, apercebo-me do que estou a fazer. Enlouqueci. Porquê ser apanhado por uma bruxa? E ao mesmo tempo...porque não ser enfeitiçado por aquela força misteriosa e apetecível? Fugir da dimensão humana, ir mais longe?

Continuo, com o coração a bater mais ruidosamente. Tudo parece ainda mais escuro - e errado. Começo a transpirar, e o cansaço começa a incomodar o meu corpo.

Ouço um barulho no meio do mato - e dou um pulo. Foi só uma cobra. Passo por uma paragem de autocarros. Olho duas vezes, à espera de encontrar algo aterrador. Ainda não. Não paro, com um misto de receio, determinação e vontade no olhar.

Por fim, chego a um beco sem saída. Com a cabeça a rodopiar, pulsação no auge, pouca clareza, começo a pensar que cometi um erro. No entanto, olho em volta e tudo parece parado, quieto. Tudo foi um sonho. Não há mais ninguém vivo ali.

-"Estavas à procura de alguma coisa?"- diz uma voz satisfeita.

Fico petrificado. Viro-me, e à minha frente, o pior dos meus medos - a maior das minhas conquistas. Cabelo preto pela cintura, lábios pretos; nariz perfeito e longas pestanas pretas que por pouco não ofuscam o brilho daqueles olhos verdes, redondos.

Não respondo. Tento dar um passo atrás, mas tropeço numa abóbora e acabo por cair estendido no chão. Bolas! Porque é ela mais poderosa do que eu?

Inclina-se sobre mim, sempre com aquele sorriso insinuante e divertido. E eu tento-me mexer e barafustar...até que a cor daqueles lábios me amaldiçoa. Leva-me por um caminho que não conheço, por uma estrada cheia de rodopios e curvas, por uma gruta desconhecida. Há vários sons pelo meio, qualquer um deles incompreensível.

E quando tudo acaba, sem me aperceber, ela foi-se.
Voa pelo frio gélido da noite, na sua vassoura, pronta a enfeitiçar mais alguma mente mundana.

Esqueçam os doces; prefiro travessuras.

quinta-feira, 29 de outubro de 2009

The road of the sun

Queres mudar o teu mundo.

Estás farto do monótono céu cinzento, do sol invisível, das nuvens opacas.

Sais de casa com os cordões desapertados, com o casaco aberto, cabelo desgrenhado, unhas de agricultor.


O que é que isso importa?

És um génio, no meio do rebanho. Aquele que realmente sabe o que importa, cujo valor não será nunca reconhecido até que a sua vida chegue à última estação.


Não tens de ficar. Não sairás derrotado, humilhado, de cabeça baixa. Apenas estás a seguir o teu sonho. És senhor da coragem de admitir, incapaz de ser tomado pela ilusão.

Passo após passo, longe da margem, perto da luz. Ninguém a irá deixar visível para ti, terás de ser tu a destapá-la.

E quando se oferecerem para te mostrar o caminho, saberás que preferes caminhar sozinho, orientado pelo ténue brilho do luar.


Mesmo que a meio te barrem o caminho, não terás de permanecer imóvel, qual angustiante indecisão, eterna.

Poderás voltar atrás e percorrer os teus desejos.


Quando te questionarem, não terás de os fazer acreditar no que dizes; apenas basta que tu próprio acredites.

E continuarás a caminhar, a espezinhar os espinhos que ousam atravessar-se à tua frente.

Um pé depois do outro, ombros a deslizarem ritmadamente, rumo ao futuro risonho que te espera.

Olhos focados no horizonte, lábios firmes e decididos, de quem está prestes a mudar de rota.

Boa sorte! Encontramo-nos um dia - no fim do percurso.

terça-feira, 27 de outubro de 2009

Em busca da felicidade

Sinto os acordes da guitarra. A pancada seca e ritmada da bateria. A doce gentileza do piano.

Movo-me ao som da angústia, da paixão, do fogo que me queima lentamente.

Liberto a raiva que me possui, a tristeza que me pára, o medo que me tolda.

Ninguém me importa neste momento, qual rosa narcisista que floresce sozinha, acima de todas as outras.


Oh, quão efémera! Subitamente, a música acaba. Todos começam a partir.

Sentimentos sufocados de novo nessa masmorra secreta, dentro da alma. Apenas resta a escuridão, intensa e livre.

Tomado pela frieza enigmática da noite, enfeitiçado pela aura misteriosa do luar.

A Lua deixa caír lágrimas cinzentas; sabe que nunca me conseguirá mostrar a estrada a seguir.

E a brisa gélida chega...e com ela, uma nova dor, uma nova ânsia.

Onde irei acabar?


Não, não será assim tão simples. Não quero parar.

Faço-me ao caminho, animado pela chama quente que despoletou no meu corpo.

Caminho horas a fio, pelo meio dos milheirais, cuja altura me faz sentir insignificante; continuo por um bosque calmo, onde apenas as árvores sussurram; a dada altura entro na vila, pacata àquela hora, pouco antes do acordar.

Serpenteio por entre as pequenas casas rústicas, construídas em pedra.

A vila está cheia de ruelas e becos dos quais é difícil saír; ao fim de muito esforço, consigo encontrar aquele palácio majestoso, com um porte capaz de entorpecer os sentidos, com uma beleza capaz de acordar qualquer velho coração adormecido...

Não bato à porta - não quero acordar quem lá mora. Entro suavemente por entre os portões - e dirijo-me às escadas, cobertas por um suave tecido vermelho.

Chego ao topo - esquerda ou direita? Tanto faz. Sigo rumo a um dos lados, pedindo para que a sorte me proteja.

O corredor é ricamente decorado. Tem quadros difíceis de contemplar, visto que apenas são alumiados por algumas tochas, que ainda assim mostram as molduras douradas.

O chão tem algumas peles de animais, e ainda que produto de um acto cruel, transpiram luxo e requinte.


Há três quartos, apenas um deles com a porta fechada. Após alguma hesitação, entro nesse.

Encontrei-a. Fios de cabelo de um loiro vibrante, quase dourado, correm até ao pescoço, ondulados; tez muito clara, que respira inocência e sensualidade. Aproximo-me um pouco mais.

As suas pálpebras delicadas repousam ainda, exibindo longas pestanas e sobrancelhas finas e sinuosas.

Devagar, aproximo-me da sua face. Tornam-se visíveis algumas sardas e a pele sedosa que tem. Outra dimensão me prende... até que toco aqueles lábios doces, sossegados, durante alguns momentos.

Ela acorda, lentamente; quando me reconhece, sorri.

Fitamo-nos intensamente. Não há perguntas. Não são necessárias palavras. Apenas mais um beijo...e outro.


quinta-feira, 22 de outubro de 2009

Fading Away

Porquê acordar?

O fumo, qual multidão sedenta, não se dispersou.

O peso da minha alma não voou.

A mágoa que sinto regressou.


A luz adoece, amarela e persistente.

O espírito acorda, demente.

As ruas explodem, num clarão potente.


Não quero querer o que queria

Este sonho em mim morria

A minha casa ficou vazia


Perto de mim, a distância

Sufocante, a minha ânsia

E o dia por mim passa, e avança


Noutro canto, um sonho

Longe deste lugar medonho

Onde o sol volta a parecer risonho.

quinta-feira, 15 de outubro de 2009

A esfera

O relógio não vai parar. Não agora.

Quero que ande. Que corra. Que fuja.

Da pressão, do borbulhar que sinto dentro, da mágoa enfuriante.

Não deixes que a luz se apague. Tenho medo do escuro.

Não percebes? Toda a minha vida, envolto nesta carapaça distante.

Ela faz com que ninguém consiga penetrar nesta esfera enigmática.

Mas tu consegues. Atira-la contra o chão, vezes sem conta.

E nela aparecem riscos e lágrimas, sempre que te aproximas.

O vidro está gasto. A cada dia que passa, vês menos nesta esfera. Ela fora mágica, outrora.

Mostrou-te o mundo, a vida, o verdadeiro significado da palavra sentir.

Estás a perdê-la. Um dia, o vidro vai partir. Tudo será fumo.

Não conseguirás encontrar outra igual.

Nunca. Para sempre.

sábado, 3 de outubro de 2009

The end

O quarto estava sombrio.

No escuro, apenas um vulto deitado na cama a chorar. Lágrimas quentes, que caiam como folhas de outono.

Ele não o merecia. Ele fizera tudo o que podia fazer.

Porque é que a sua vida era um profundo fracasso? Porque é que era alvo de chacota, e ao mesmo tempo tão brilhante e humano?

Ninguém o compreendia. Estaria sempre sozinho, e foi naquele momento que se apercebeu disso.

Saiu sem que ninguém se apercebesse, batendo delicadamente a porta de casa.

Percorreu inconscientemente todas as ruas daquela terra gélida, deserta e inculta.

Numa delas, parou e sentou-se no chão indigno de si. A culpa não era sua e toda a gente iria engolir em seco quando visse como havia sido bem sucedido!

Pegou no seu pequeno caderno de bolso e começou a escrevinhar algo que se tornou incompreensível, dadas as gotas que caíam sobre aquelas folhas de papel baratas.

A dada altura, deixou de escrever.

De que lhe valia ser bem sucedido se continuaria infeliz? Se ninguém o iria respeitar? Não tinha nenhuma maneira de se escapar.

Naquele momento, McLeash dissipou-se como fumo num dia cáustico. E com ele foram as memórias de um rapazinho desajeitado, fechado, que não pertencia ali.

No entanto, o seu mundo viveria para sempre, graças àquelas folhas de papel.

quinta-feira, 17 de setembro de 2009

A love affair

Isto faz parte de uma pequena história que vou escrevendo e avançando, quando assim me apetece. É completamente despretensiosa, e só espero que seja agradável de ler.


Era um calmo riacho.

De um azul-esverdeado, com alguns pequenos peixes viajando tranquilamente no seu leito morno.

As margens eram húmidas, com erva de um verde brilhante, extraordinariamente vivo. Existiam também algumas árvores, com aspecto secular, mas majestosas no seu porte poderoso.

Estava ali deitado, distante de tudo, com a Sophie. Conhecemo-nos há 11 anos. Vivíamos na mesma rua, St. Peter's Lane, na pouco ortodoxa mas fascinante Manchester. Ambos fomos desenvolvendo ao longo do tempo uma curiosa apetência por livros, filmes e música menos generalistas e pouco conhecidos pela maioria.

Sophie era a única pessoa com quem falava de tais temas, sob pena de ser considerado um estranho alien desorientado neste universo. Em suma, podia falar de tudo e sentir-me bem com isso. Além de que ser compreendido era muito satisfatório...nunca o fora por parte de muitas outras pessoas que partilhavam a minha idade.

Contudo, em apenas alguns dias, a nossa relação pareceu mudar.

Nessa tarde, divertíamo-nos a contar anedotas um ao outro, naquela humidade tranquilizante. E subitamente...

A sua pele exalava um cheiro tão convidativo, suave e apetecível. Tinha uma textura capaz de enlouquecer quem dela se afastasse por muito tempo, e era facilmente comparável a seda.

Ela era extremamente pálida, ainda que as bochechas solarengas mostrassem o quão quente aquele dia estava.

Os seus olhos pareciam cada vez mais intensos e vivos, tantas vezes os fitei nos últimos dias, ainda que o castanho claro que exibiam se mantivesse inalterado (e combinasse deliciosamente com os seus lisos cabelos castanho-mogno).

Ela observou o meu ar distante e disse, com uma nota de leve irritação e, ao mesmo tempo, diversão na voz:

-Não ouviste nada do que eu disse! Em que estás a pensar?

Rapidamente, tentei esconder todos aqueles pensamentos no mais escuro e inatingível baú da minha mente, e retorqui suavemente:

-Em nada...é tão bom estar aqui contigo, sem ter nada marcado para fazer a seguir.

-Oh- começou ela - sim, também gosto de estar contigo. És...diferente, especial - proferiu ela, num cliché que interpretei ingenuamente.

-Ah, sim, sou excelente a deitar-me debaixo de árvores com raparigas bonitas - murmurei, suficientemente alto para que ela ouvisse.

Ambos nos rimos levemente. Subitamente, parei e olhei-a nos olhos. Apenas um pensamento se apoderou de mim.

Ela percebera o que estava prestes a acontecer. Fechou os olhos e inclinou a sua face; hesitei por um momento. Coloquei a minha mão suavemente por trás do seu pescoço. Conseguia sentir a minha respiração descontrolada, ofegante....e aproximava-me cada vez mais.

Por fim, os meus lábios tocaram lentamente aqueles, delicados e finos. Nunca sentira nada assim. Se a perfeição existisse, teria de estar concentrada naquele gesto tão simples e doce. Não queria que acabasse...

Não sei quanto tempo demorou ao certo. Mas subitamente, tudo se desvaneceu.

-Porque fizeste isto? - sibilou Sophie, num tom de voz quase digno de súplica.

Hesitei antes de responder.

-Eu, hmm... - tentei evitar o olhar, focando-me nas belas árvores, onde repousavam alguns melros - pensei que também o quisesses.

-Não! - insistiu, apesar da sua voz ter falhado - Nós, nós...não consigo, somos amigos há demasiado tempo!

-Mas porquê? Pensei que também o tinhas sentido! - afirmei, ansioso.

Num ápice, levantou-se e, com o rosto a transparecer o quão confusa estava, atirou:

-Desculpa...! Tenho de ir. Falamos depois!

-Sophie! Espera! - gritei, na esperança de que ela voltasse atrás.

Desapareceu rapidamente por entre os raios de verão, deixando-me só.

Eu girava num turbilhão de sentimentos: porque havia ela reagido assim? Teria falhado miseravelmente? Ela não gostava de mim? E se, pior, tudo fosse destruído por aquele impulso?

No fundo, se nos devemos deixar guiar pelo que sentimos, porque havia aquele momento fugaz deitado tudo a perder?

Senti-me incapaz de reagir, devido ao novelo de preocupações que se começava a formar dentro de mim.

Deixei-me ficar ali, perdido no meu mundo.

domingo, 13 de setembro de 2009

Momentos perdidos

A vida é um caminho bastante sinuoso, impreciso e durante o qual somos uma nuvem capaz de se desvanecer a qualquer momento. Subitamente, qualquer coisa pode acontecer.

Há momentos em que estamos à beira do fim, e por uns centímetros escapamo-nos. E não temos a noção do que aconteceu.

Não conseguimos perceber que tudo podia ter acabado ali. Este é, provavelmente, o motivo do pouco valor que atribuímos a certos momentos.

Continuamos a projectar, planear, assumir presunçosamente que tudo vai correr como desejamos...e basta uma falha para nos fazer sentir frustrados, desiludidos, impotentes.

Além disso, somos incapazes, em muitas alturas, de saborear e disfrutar momentos que poderiam ser maravilhosos. Devido ao facto de queremos sempre mais e mais.

Esquecemo-nos de que, na vida, o que importa não é só o lugar onde chegamos, mas sim o modo como delineamos o percurso até lá.

O ser humano tem uma maneira incompreensível de decidir o que é melhor para si, o que o faz sentir-se mais feliz e realizado. Mesmo com tantos vultos errantes que poderiam mostrar o caminho.

sexta-feira, 11 de setembro de 2009

Contradições

Bem sei que o título do blog é "Palavras Vagas", mas de certeza que qualquer um sabe que nem só disso vive uma pessoa.

Hoje dei por mim a constatar que há dias em que a frustração (ou outro sentimento qualquer, isso é o que menos importa agora) impede algumas actividades.

Uma delas é conduzir. Experimentem conduzir depois de terminarem uma relação (que valeu qualquer coisa mínima para vocês, é preciso fazer notar este pormenor!) e vão parecer tão imprecisos e estúpidos como uma loira de saltos altos a conduzir com as mamas em cima do volante! (nenhuma ofensa à classe das loiras de mamas grandes - são um pacote bastante apetecível...e também têm um pacote bastante apetecível!).

É uma falha comum a uma boa fatia da humanidade; quando não se está seguro e se faz um erro...vêm mais uns quantos numa fracção de segundos. Mas bom, erros piores serão certamente coisas como:

-Votar no PS;
-Dizer que Portugal é uma província espanhola (dedicado a americanos);
-Comprar um portátil e-escola, mesmo tendo um PC em casa, só por causa da banda larga móvel (que é maravilhosa *cof cof*)
-Ouvir D'zrt;

No entanto, eu sou generoso, e mesmo cometendo esses erros serão bem vindos neste blog. OK, excepto se ouvirem D'zrt.

Voltando atrás, além da impossibilidade de conduzir decentemente em dias de frustração intensa (ou o tal outro sentimento!), ia referir que talvez não fosse possível escrever condignamente também.

Mas parece que estou redondamente enganado, tendo em conta vários sofredores da nossa Pátria com excelentes imagens das suas almas impregnadas em perfumadas páginas.

Portanto, não vos maço mais e desejo-vos um excelente início de fim-de-semana!

quinta-feira, 10 de setembro de 2009

Distractions...

Num dia tudo está bem, noutro dia surge o vazio. Vazio esse que talvez sempre tenha existido, escondido sorrateiramente dos levianos olhos humanos.

Talvez fosse só uma sensação vã de conforto e egoísmo.

Talvez a minha alma tenha sido libertada, nessa justa tristeza que aos poucos abandona o carrossel que nunca pode parar. Qual soldado de guerra, pronto a esquecer as mágoas, pronto a recomeçar a sua corrida contra o tempo.

Estado de espírito propício a ouvir Zero 7 - Distractions. Vale a pena!

quarta-feira, 9 de setembro de 2009

Saudade...

Saudade…

Qual faca cortante, capaz de atravessar qualquer profunda caixa de Pandora, dessas que existem na imensidão dos sonhos e medos.

Tão cruel, na forma como se alimenta da maior fraqueza e, ao mesmo tempo, da maior arma de combate que vagueia nessas preciosas caixas atrás citadas.
Trata-se, claro, do desejo de ser desejado, de ser presença solarenga e marcante nas manhãs (e tardes!) de qualquer existência.

A ânsia de um doce beijo suave, da explosão atómica quando as mãos se enlaçam, os olhos fechados, como que incapazes de contemplar algo tão poderoso como é o amor.

E depois... somos levados no turbilhão, incapazes de raciocinar com clareza, incapazes de quebrar a ilusão.

Pandora liberta o monstro, ofegante.
O desejo de ter e não poder, querer e não chegar, ousar e magoar. Quando a máscara suplica ardentemente por satisfação e, quão humano e repugnante, ela é concedida.

O vislumbre das amargas águas do mar, do salgado areal, dos pensamentos perdidos – perdidos não, há muito encontraram apenas uma personagem principal.
Os minutos vagarosos, a vida incompleta, apenas metade vivida - mar sem terra, tela sem cor, amor sem dor.

E, no entanto…não ter saudades é não amar; não voar; não ver, não viver. Esconder-se como rato medroso num beco negro e doloroso.

Errar, verbo fatal, incompreendido pelos humanos. Sempre tido em tão má conta, um genuíno refugiado de qualquer dicionário. E de quem é a culpa, pelo menos neste caso? Ah!
Saudade…