quinta-feira, 29 de outubro de 2009

The road of the sun

Queres mudar o teu mundo.

Estás farto do monótono céu cinzento, do sol invisível, das nuvens opacas.

Sais de casa com os cordões desapertados, com o casaco aberto, cabelo desgrenhado, unhas de agricultor.


O que é que isso importa?

És um génio, no meio do rebanho. Aquele que realmente sabe o que importa, cujo valor não será nunca reconhecido até que a sua vida chegue à última estação.


Não tens de ficar. Não sairás derrotado, humilhado, de cabeça baixa. Apenas estás a seguir o teu sonho. És senhor da coragem de admitir, incapaz de ser tomado pela ilusão.

Passo após passo, longe da margem, perto da luz. Ninguém a irá deixar visível para ti, terás de ser tu a destapá-la.

E quando se oferecerem para te mostrar o caminho, saberás que preferes caminhar sozinho, orientado pelo ténue brilho do luar.


Mesmo que a meio te barrem o caminho, não terás de permanecer imóvel, qual angustiante indecisão, eterna.

Poderás voltar atrás e percorrer os teus desejos.


Quando te questionarem, não terás de os fazer acreditar no que dizes; apenas basta que tu próprio acredites.

E continuarás a caminhar, a espezinhar os espinhos que ousam atravessar-se à tua frente.

Um pé depois do outro, ombros a deslizarem ritmadamente, rumo ao futuro risonho que te espera.

Olhos focados no horizonte, lábios firmes e decididos, de quem está prestes a mudar de rota.

Boa sorte! Encontramo-nos um dia - no fim do percurso.

terça-feira, 27 de outubro de 2009

Em busca da felicidade

Sinto os acordes da guitarra. A pancada seca e ritmada da bateria. A doce gentileza do piano.

Movo-me ao som da angústia, da paixão, do fogo que me queima lentamente.

Liberto a raiva que me possui, a tristeza que me pára, o medo que me tolda.

Ninguém me importa neste momento, qual rosa narcisista que floresce sozinha, acima de todas as outras.


Oh, quão efémera! Subitamente, a música acaba. Todos começam a partir.

Sentimentos sufocados de novo nessa masmorra secreta, dentro da alma. Apenas resta a escuridão, intensa e livre.

Tomado pela frieza enigmática da noite, enfeitiçado pela aura misteriosa do luar.

A Lua deixa caír lágrimas cinzentas; sabe que nunca me conseguirá mostrar a estrada a seguir.

E a brisa gélida chega...e com ela, uma nova dor, uma nova ânsia.

Onde irei acabar?


Não, não será assim tão simples. Não quero parar.

Faço-me ao caminho, animado pela chama quente que despoletou no meu corpo.

Caminho horas a fio, pelo meio dos milheirais, cuja altura me faz sentir insignificante; continuo por um bosque calmo, onde apenas as árvores sussurram; a dada altura entro na vila, pacata àquela hora, pouco antes do acordar.

Serpenteio por entre as pequenas casas rústicas, construídas em pedra.

A vila está cheia de ruelas e becos dos quais é difícil saír; ao fim de muito esforço, consigo encontrar aquele palácio majestoso, com um porte capaz de entorpecer os sentidos, com uma beleza capaz de acordar qualquer velho coração adormecido...

Não bato à porta - não quero acordar quem lá mora. Entro suavemente por entre os portões - e dirijo-me às escadas, cobertas por um suave tecido vermelho.

Chego ao topo - esquerda ou direita? Tanto faz. Sigo rumo a um dos lados, pedindo para que a sorte me proteja.

O corredor é ricamente decorado. Tem quadros difíceis de contemplar, visto que apenas são alumiados por algumas tochas, que ainda assim mostram as molduras douradas.

O chão tem algumas peles de animais, e ainda que produto de um acto cruel, transpiram luxo e requinte.


Há três quartos, apenas um deles com a porta fechada. Após alguma hesitação, entro nesse.

Encontrei-a. Fios de cabelo de um loiro vibrante, quase dourado, correm até ao pescoço, ondulados; tez muito clara, que respira inocência e sensualidade. Aproximo-me um pouco mais.

As suas pálpebras delicadas repousam ainda, exibindo longas pestanas e sobrancelhas finas e sinuosas.

Devagar, aproximo-me da sua face. Tornam-se visíveis algumas sardas e a pele sedosa que tem. Outra dimensão me prende... até que toco aqueles lábios doces, sossegados, durante alguns momentos.

Ela acorda, lentamente; quando me reconhece, sorri.

Fitamo-nos intensamente. Não há perguntas. Não são necessárias palavras. Apenas mais um beijo...e outro.


quinta-feira, 22 de outubro de 2009

Fading Away

Porquê acordar?

O fumo, qual multidão sedenta, não se dispersou.

O peso da minha alma não voou.

A mágoa que sinto regressou.


A luz adoece, amarela e persistente.

O espírito acorda, demente.

As ruas explodem, num clarão potente.


Não quero querer o que queria

Este sonho em mim morria

A minha casa ficou vazia


Perto de mim, a distância

Sufocante, a minha ânsia

E o dia por mim passa, e avança


Noutro canto, um sonho

Longe deste lugar medonho

Onde o sol volta a parecer risonho.

quinta-feira, 15 de outubro de 2009

A esfera

O relógio não vai parar. Não agora.

Quero que ande. Que corra. Que fuja.

Da pressão, do borbulhar que sinto dentro, da mágoa enfuriante.

Não deixes que a luz se apague. Tenho medo do escuro.

Não percebes? Toda a minha vida, envolto nesta carapaça distante.

Ela faz com que ninguém consiga penetrar nesta esfera enigmática.

Mas tu consegues. Atira-la contra o chão, vezes sem conta.

E nela aparecem riscos e lágrimas, sempre que te aproximas.

O vidro está gasto. A cada dia que passa, vês menos nesta esfera. Ela fora mágica, outrora.

Mostrou-te o mundo, a vida, o verdadeiro significado da palavra sentir.

Estás a perdê-la. Um dia, o vidro vai partir. Tudo será fumo.

Não conseguirás encontrar outra igual.

Nunca. Para sempre.

sábado, 3 de outubro de 2009

The end

O quarto estava sombrio.

No escuro, apenas um vulto deitado na cama a chorar. Lágrimas quentes, que caiam como folhas de outono.

Ele não o merecia. Ele fizera tudo o que podia fazer.

Porque é que a sua vida era um profundo fracasso? Porque é que era alvo de chacota, e ao mesmo tempo tão brilhante e humano?

Ninguém o compreendia. Estaria sempre sozinho, e foi naquele momento que se apercebeu disso.

Saiu sem que ninguém se apercebesse, batendo delicadamente a porta de casa.

Percorreu inconscientemente todas as ruas daquela terra gélida, deserta e inculta.

Numa delas, parou e sentou-se no chão indigno de si. A culpa não era sua e toda a gente iria engolir em seco quando visse como havia sido bem sucedido!

Pegou no seu pequeno caderno de bolso e começou a escrevinhar algo que se tornou incompreensível, dadas as gotas que caíam sobre aquelas folhas de papel baratas.

A dada altura, deixou de escrever.

De que lhe valia ser bem sucedido se continuaria infeliz? Se ninguém o iria respeitar? Não tinha nenhuma maneira de se escapar.

Naquele momento, McLeash dissipou-se como fumo num dia cáustico. E com ele foram as memórias de um rapazinho desajeitado, fechado, que não pertencia ali.

No entanto, o seu mundo viveria para sempre, graças àquelas folhas de papel.