Inspira forte. O fumo entra em formato de cornucópia pelas narinas feridas do frio. O cérebro engasga-se com a nuvem densa que atordoa também os sentidos.
O fumo não é físico, visível e de odor palpável; não. É visceral, possui o corpo e atira-o para o desespero. No turbilhão de cinzas está envolto, de forma confusa, o pior de nós. Está o abismo do não ter, do não controlar (por não ver).
O fumo é uma obcessão. É difícil impedir que se imiscua dentro de nós, dado que para tal teríamos de parar de respirar - e de repousar eternamente na valeta, esperando pela degradação em pó.
Assim, o fumo faz parte da condição humana de alguns. Viver é sentir o fumo, umas vezes mais fraco, outras vezes mais opaco e negro, queimando a memória alegre e conservadora do eu e da espécie. Sentir o fumo, arder por dentro e chegar ao cúmulo de deixar as labaredas saír, é o que nos distingue de um calhão inerte.
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